A saúde dos reis sempre constituiu um fenómeno de grande
impacto social e de interesse público e diplomático. Em todos os tempos, a
medicina prestou especial atenção às principais figuras do reino. Perante
qualquer fenómeno de doença ou de curiosidade eram convocados os médicos mais
conceituados para acudir o Monarca. Naturalmente, assim acontecia também com os
maxilares e os dentes de Suas Altezas Reais. No Egito, sobram poucas dúvidas
aos estudiosos de que terá sido uma cárie no maxilar superior que causou a
morte, por infecção disseminada, ao faraó Ramsés II. Em França, asseguram os documentos
oficiais que Luís XIV, o Rei Sol, terá nascido no dia 5 de Setembro de 1638 já
com dois dentes visíveis nas gengivas, garantindo-se o mesmo sobre o Imperador Napoleão
Bonaparte e o Rei Ricardo III de Inglaterra.
Nos registos médicos da Real Câmara portuguesa existem duas
referências em particular que merecem ser partilhadas e que, devidamente
comparadas, demonstram, pelo espaço temporal entre os dois períodos régios, a
evolução científica que a medicina portuguesa, em conjunto com as outras
sociedades europeias, foi adquirindo e que já dispunha no início do século XX.
O primeiro trata-se de um registo, à luz de hoje, bizarro e
pitoresco, em que o “concílio dos sábios” determinou que um ossículo
ensanguentado, expelido através da narina de Sua Majestade D. Pedro II (Reinado:
1683-1706), se tratava de um resíduo fragmentário de uma perna de tordo
ingerida três semanas antes e que não tinha qualquer relação com a volumosa
lesão escavada no palato, com fístula e erosão, provável manifestação oral de
doença sexualmente transmissível, a mais suspeita causa de morte do Rei.
Em contraste, dois séculos mais tarde, em Janeiro de 1906, o Dr.
Tomás de Mello Breyner, escrevia no seu diário aquela que é talvez a primeira
descrição sobre a relação entre diabetes
mellitus e doença periodontal, a propósito da situação clínica do Rei D.
Carlos I (Reinado: 1889-1908): “Fui ao
Paço das Necessidades procurar a rainha para lhe dizer que El-Rei é um
diabético. Com 22,560 g de açúcar por litro. (...) Bem desconfiava eu quando há
menos de um mês lhe caíram uns dentes molares.”
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